domingo, 5 de junho de 2016

Além dos trintas, além da cultura

                                           Além dos trintas, além da cultura.



              O número trinta ganhou um significado profundamente repulsivo, nesses últimos dias. E por mais repugnante que seja, foi real,  aproximadamente, trinta e três homens violentaram sexualmente uma menina de 16 anos, depois de ter sido dopada pelos mesmos. Dentre as várias definições dessa violência, somente uma a faz de forma categórica: ESTUPRO!

             Muitas pessoas estão chocadas com a crueldade do acontecimento. E não é para menos que estejamos assim. Lamentável é não estar todo mundo perplexo. Por isso, o humanamente esperado é que se tente compreender o porquê dessa barbárie. Mas, será que tem  explicação? A resposta é: sim, claro que tem! E o motivo é por hábito considerado como um não motivo, o que também se explica. Inventam mil e umas justificativas, até mesmo de responsabilizar a própria vítima pela violência sofrida. Mas, não há outra razão que não seja esta: MACHISMO!

              Se a intenção é entender "aquilo"( o estupro coletivo),  então, primeiro, precisamos não mascarar a realidade. Não foi por acaso, 33 homens cometeram um crime, sem a participação de nenhuma mulher. Isso mesmo, HOMENS. Não foi a raça humana (esse ente genérico). Não foi a bebida. Não foi uma roupa curta. Não foram monstros imaginários. Foram homens. E, nenhum deles se solidarizou ao ponto de interromper a violência. Nenhum! Ao contrário, riram, debocharam e compartilharam o estupro nas redes sociais. E adivinhem? Encontraram plateia, defensores e justificadores (cúmplices). Porque sim, qualquer tentativa de justificar essa violência culpabilizando a vítima, significa ser cúmplice dos violentadores.

             Na tentativa de ir além do sentimento de choque diante da barbárie, é necessário localizar que a violência contra mulher, inclusive o estupro, está situada dentro de uma definida estrutura social. Não é coincidência ou um mero fenômeno natural, o fato de ser a família o espaço onde mais se violentam mulheres.

Aquela afirmação não é uma mera opinião da autora deste texto, são dados que chegam a índices alcançados em guerras civis: no Brasil, de 2010 a 2013, 17.581 mulheres morreram vítimas de violência doméstica. Há estudos que indicam que, a cada uma hora e meia morre uma  mulher, em decorrência de agressões cometidas por familiares (principalmente os maridos e namorados). Esses dados indicam que a violência contra a mulher é endêmica, mas, sobretudo, sistêmica. Sem falar, nos outros números de violências psicológicas, sexuais e patrimoniais. Por isso, qualquer banalização do tema não ajuda e qualquer sensacionalismo, tão pouco.

A família tradicional é base do patriarcalismo e do capitalismo. Ela é um pilar de sustentação da atual sociedade que vivemos. Há profunda relação entre a dominação que a classe burguesa exercer contra a classe trabalhadora, com a dominação que os homens exercem contra as mulheres. É por isso que a opressão contra a mulher acompanha o movimento das classes sociais em luta. Quanto maior é o ataque da classe dominante contra a classe trabalhadora, maior é a força dos instrumentos de dominação contra a mulher.

Isso quer dizer que para haver uma cultura do estupro é preciso ter uma base concreta na sociedade que permita ela existir, essa base é patriarcado. É bom lembrar que o estupro, durante a Ditadura Burguesa Militar, foi uma política de estado no Brasil e na América Latina. Nas guerras o estupro faz parte da lógica de ataques dos soldados. Homens quando são presos, “transformam” outros homens presos em “mulheres” e os estupram. Por tanto, o estupro não tem nada a ver com sexo ou prazer. O estupro é um instrumento de poder, usado com o objetivo de submeter uma pessoa à outra pessoa, na esmagadora maioria das vezes, é instrumento de poder e violência usado pelos homens para submeter e agredir mulheres.

Aparentemente existe uma sensação que atualmente há mais casos de violência contra mulher, mas isso não é verdade, sempre existiu este tipo de violência, a diferença é que o seu conhecimento saiu em parte da esfera privada para se tornar um debate público, seja pelo advento da internet, seja pelos ainda tímidos avanços conquistados através de políticas públicas e legislações direcionadas à efetivação dos direitos das mulheres.   

O machismo, com todas as suas faces, é a expressão máxima da sociedade patriarcal, a cultura do estupro é mais um mecanismo desta estrutura social, altamente injusta. Não é por acaso que a agenda neoliberal de desmonte aos direitos trabalhistas, imposta pelo Governo Golpista Temer, veio acompanhada de uma agenda conservadora que ataca os direitos das mulheres. A exemplo da possibilidade de proibir o aborto em caso de estupro. Imagina a vítima do estupro coletivo ser obrigada a manter uma gravidez? Imagina!

Não é por acaso que o Golpe que atingiu a primeira mulher eleita presidenta, foi marcado por falas como a do crápula fascista, Jair Bolsonaro, que homenageou o estuprador e torturador de Dilma, o ditador Brilhante Ustra. Não há coincidência que com o aumento da crise capitalista a ameaça aos direitos das mulheres se tornou mais latente, inclusive o direito a vida, a dignidade da pessoa humana. Somente, outro projeto de sociedade que busque a libertação plena de todos os seres humanos, que combata todo e qualquer tipo de exploração será capaz de por fim em instrumentos de dominação como o estupro. Este deve ser combatido na sua manifestação cultural, mas, sobretudo, deve ser combatido na sua estrutura de sustentação, o patriarcado. O caminho da liberdade, da dignidade humana, da igualdade plena entre pessoas diferentes, não é se não o caminho para uma sociedade: FEMINISTA E SOCIALISTA!    

Ariely de Castro
Assistente Social, militante do PT/AE e feminista.
          


           
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